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Economia, dívida, SNS e apoios à pandemia. Os nove pontos principais da análise de Bruxelas a Portugal
Jornal Económico sapo


Turismo, apoios, mercado de habitação, dívida privada, divida pública, défice orçamental, SNS, banca e capacidade de pagamento aos credores. A Comissão Europeia considera que Portugal continua a ter a capacidade financeira para cumprir as suas obrigações para com os credores, mas alerta que, depois da pandemia, é preciso retomar o ajuste orçamental “amigo do crescimento”.

Bruxelas analisou as principais alterações que a economia portuguesa enfrenta e deixou vários alertas no relatório regular de monitorização da Comissão Europeia divulgado na quarta-feira. Da banca, ao turismo, passando pelo SNS e a dívida, Bruxelas analisou à lupa os maiores desafios que a economia nacional enfrenta.

Na quarta-feira, a Comissão Europeia também anunciou que considera que a proposta do Orçamento do Estado para 2021 está “globalmente em conformidade” com as recomendações do Conselho Europeu, apesar de deixar avisos que o Governo vai ter de avaliar regularmente as medidas de apoio à atividade económica.

1 – Economia muito dependente do turismo estrangeiro

Apesar de reconhecer que a economia como um tudo mostrou “bons sinais de recuperação” no terceiro trimestre devido ao levantamento gradual das restrições. Fora a indústria hoteleira, “a maior parte dos setores registaram uma recuperação gradual nos meses de verão, apesar de permanecerem abaixo dos níveis pré-crise”.

Bruxelas destaca que em setembro as atividades relacionadas com o turismo estrangeiro ainda estavam 70% abaixo do período homólogo e que a nova vaga de infeções teve consequências para o setor da aviação, “essencial para a indústria do turismo” no país, o que “atrasou o ritmo de recuperação”.

A Comissão aponta que o PIB deverá recuar este ano para os 9,3%, com uma queda de 5,4% em 2021, apontando para os riscos para a economia devido “à grande exposição ao turismo estrangeiro onde permanecem incertezas significantes”.

2 – Apoios a cidadãos e empresas são para manter

A Comissão Europeia reconhece que as medidas de apoio social “amorteceram significativamente o impacto negativo no mercado laboral. As medidas desenhadas para proteger empregos foram muito eficazes em evitar um maior aumento do desemprego”.

Cerca de 750 mil pessoas, ou quase 15% da força laboral, tiveram direito a estes apoios entre março e julho, como o layoff simplificado, destaca Bruxelas.

Se estas medidas se mantiverem, “devem ser ajustadas regularmente às condições do mercado laboral e aos desafios sociais”, defende o documento.

Ao mesmo tempo, Bruxelas alerta que o fim destas medidas “deve ser gradual, para ajudar a evitar” que os beneficiários fiquem, de repente, sem apoio, para não prejudicar a recuperação. O documento sinaliza o programa de 5,9 mil milhões de euros no âmbito do SURE para ajudar a mitigar os riscos de desemprego.

3 – Mercado de habitação residencial

Analisando o mercado residencial, a Comissão Europeia aponta que o mesmo continua “resiliente”, enquanto os preços das casas descem lentamente, apontando para um crescimento de 7,8% no segundo trimestre face a período homólogo, uma desaceleração face aos 8,9% em 2019

Observando que os preços das casas têm vindo a crescer desde o final de 2013, devido principalmente às “dinâmicas do turismo e ao investimento por não residentes antes da crise”, a Comissão aponta que o mercado “não registou um aumento comparável em novos créditos à habitação”.

Sobre os preços, vários fatores apontam para um maior abrandamento no crescimento dos preços das casas no curto prazo.

Já a queda no turismo vai continuar a colocar pressão para os preços descerem à medida que os alugueres de curta duração “não deverão regressar rapidamente aos níveis pré-pandemia no curto prazo”.

4 – Divida privada

Bruxelas aponta que esta crise “destacou a importância do desalavancamento observado em anos recentes”, destacando que tanto as famílias como as empresas não financeiras contribuíram para a descida da divida privada e do endividamento privado, que recuou de um máximo de 210% sobre o PIB em 2012 para 149% sobre o PIB no final de 2019.

Com esta trajetória, o setor privado “ficou com uma capacidade maior para absorver perdas e para parcialmente mitigar o choque económico da pandemia”.

Perante a atual crise económica, a dívida privada vai aumentar “significativamente” alerta Bruxelas, interrompendo assim o desalavancamento observado desde 2012.

A dívida privada subiu 9,5 pontos percentuais no primeiro semestre, com os maiores aumentos a registarem-se na produção industrial, construção e serviços. Pela positiva, o número de depósitos de empresas e lares subiu 8,7% em julho, o que poderá servir de “rede de segurança contra desenvolvimentos inesperados”.

Assim, o setor privado fica com uma almofada de segurança para enfrentar problemas financeiros no curto prazo. Contudo, o documento alerta que os dados em agregado conhecidos até ao momento não revelam os problemas de solvência nas empresas unipessoais, em particular nas mais afetadas pela pandemia.

5 – 2021 continua incerto

A perspetiva orçamental para 2021 e próximos anos “continua rodeada de uma elevada incerteza”, segundo a Comissão Europeia.

A deterioração do défice orçamental deverá ser “temporária” com um défice a atingir os 4,5% em 2021 e 3% em 2022 devido à projetada recuperação económica e ao levantar das medidas de apoio à economia, o que é consistente com um rácio de dívida sobre o PIB de 127% em 2022.

A perspetiva orçamental continua “rodeada por um elevado nível de incerteza e os riscos estão no lado negativo relacionado com a acumulação de passivos de empresa públicas e de medidas de mitigação da crise para o setor privado”, sendo preciso acrescentar os riscos relacionados com as contingências públicas relacionadas com apoios dados no passado ao “setor da banca”

6 – Reformas no SNS

O executivo de Ursula von der Leyen acredita que a “aplicação rápida de reformas anteriores poderia melhorar a resiliência do Serviço Nacional de Saúde (SNS) perante a pandemia”.

Bruxelas defende que deveriam ser implementadas várias reformas, incluindo “contratos de gestão com as administrações hospitalares para introduzir incentivos financeiros e penalizações segundo indicadores de performance”,

Em 2020, o orçamento do SNS foi reforçado em mil milhões, no âmbito do OE 2020, e em mais 300 milhões para cobrir despesas relacionadas com a pandemia.

O aumento do financiamento em combinação com o recuo dramático de procedimentos hospitalares (fora do âmbito Covid) para canalizar esforços para combater a pandemia, melhorou o balanço do SMS.

Olhando para o futuro, o SNS “permanece particularmente vulnerável à continuação da pandemia, notavelmente devido aos recursos necessários para assegurar os serviços de saúde normais a par do cuidado de pacientes Covid-19.

7 – Portugal com capacidade para cumprir obrigações perante credores

O executivo comunitário considera que Portugal mantêm inalterada a sua capacidade de cumprir as suas obrigações perante os credores no mercado de dívida soberana.

Mas perante um rácio elevado de dívida pública face ao PIB e o aumento da necessidade de financiamento devido à pandemia “os juros e a capacidade de absorção dos mercados financeiros continuam a permanecer vulneráveis, requerendo uma monitorização regular”.

No curto prazo, a “capacidade de Portugal vai continuar inalterada, com juros baixos e estáveis, assim como uma almofada sólida de dinheiro, mesmo tendo em conta o aumento súbito de necessidades de financiamento”.

No entanto, no longo prazo, é “importante uma consolidação orçamental amiga do crescimento e reformas estruturais e fiscais para reforçar a sustentabilidade orçamental de Portugal e a sua capacidade de pagar” aos credores.

8 – Dívida pública vai atingir um máximo este ano

A dívida pública sobre o rácio vai atingir um máximo de 135,1% este ano devido ao “défice primário súbito” e aos impactos da contração esperada do PIB.

Deverá voltar a recuar em 2021, acredita a Comissão Europeia, ao cair para 130,3%, com a ajuda do regresso do crescimento económico, a retirada gradual dos apoios e a chegada dos fundos europeus, que deverão atingir os 0,7% do PIB.

Assim, a dívida deverá depois recuar para 127,2% em 2022, com o rácio a cair para 110% até 2031.

Bruxelas destaca que apenas em 2028 o rácio dívida sobre PIB deverá recuar para níveis pré pandemia, registados em 2019.

Apesar da queda, o rácio deverá continuar “significativamente acima” do valor de referência europeu de 60%.

9 – Bancos devem-se preparar para enfrentar vaga de insolvências e para fim das moratórias

Na sua análise ao setor nacional da banca, a Comissão Europeia alerta que é importante que os “bancos e as autoridades preparem-se” para o aumento das insolvências de empresas, à medida que a crise económica se agrava.

Este aviso é deixado apesar de considerar que o sistema bancários português estava mais resiliente no início da pandemia do que na crise financeira global há uma década.

Com as moratórias pendentes sobre a banca, Bruxelas alerta para o aumento do risco de crédito que pode levar a um aumento das imparidades, o que vai colocar mais pressão na “rentabilidade e uma deterioração na qualidade dos ativos na forma de um aumento do rácio do crédito mal parado”.