Notícias



Portugal é dos que menos facilita manobras fiscais
JORNAL DE NEGÓCIOS


Quase metade do investimento empresarial mundial está em países que exigem taxas de imposto inferiores a 3%, segundo a Tax Justice. Portugal é dos países que menos margem dá para que as empresas façam um planeamento fiscal agressivo, mas podia fazer mais.
Portugal é dos países da União Europeia que menos facilita a vida às multinacionais que fazem um planeamento fiscal agressivo, usando manobras e vazios legais para pagar menos impostos.

Esta é uma das conclusões de um ranking divulgado na semana passada pela Tax Justice Network, uma organização não governamental que se dedica a avaliar paraísos fiscais e o seu impacto na economia a nível global.
No "Corporate Tax Haven Index", divulgado pela primeira vez este ano, a Tax Justice avaliou de que forma 64 jurisdições permitiram, em 2018, um planeamento fiscal agressivo. Entre os territórios analisados estão os principais paraísos fiscais (como as ilhas Bermudas), as grandes praças financeiras (como os Estados Unidos), alguns países africanos e asiáticos e todas as jurisdições da União Europeia.

Conclusão: 40% do total do investimento mundial reportado, ou seja, 18 biliões de dólares, está parqueado em apenas 10 países que oferecem taxas de imposto sobre o rendimento empresarial de 3% ou menos. Além disso, a Tax Justice identificou o Reino Unido (e territórios britânicos) e uma mão-cheia de países da OCDE entre os principais responsáveis pela dificuldade que os governos têm, a nível global, de taxar de forma significativa as multinacionais. "Estima-se que 500 mil milhões de euros escapem a tributação todos os anos", afirma a organização não governamental.

Portugal dá pouca margem para planeamento agressivo
Portugal é dos países que dá menos margem para um planeamento fiscal agressivo (está na 49.ª posição). Já se se considerar apenas as jurisdições europeias, Portugal é o terceiro em 34 que menos facilita as manobras fiscais das empresas. Só a Polónia e a Grécia ficam melhor.

Entre os pontos positivos de Portugal está o facto de a taxa de imposto sobre as grandes multinacionais rondar os 31,5% (incluindo a taxa de IRC e derramas estadual e municipal de 1,5%). "Portugal pontua aqui muito bem. Isto significa que as grandes empresas estão, em princípio, sujeitas a esta taxa de imposto, se nenhum outro vazio legal ou estratégia de elisão for aplicada", diz Lucas Narotzky, um dos responsáveis pelo "ranking", ao Negócios. Além disso, Portugal tem menos vazios legais do que outras jurisdições e a Zona Franca da Madeira não é tão benéfica quanto outros territórios fiscalmente mais favoráveis considerados no "ranking".

Por isso, e como as empresas colocam apenas uma pequena parte dos seus investimentos em Portugal, por cá as políticas fiscais acabam por ser menos prejudiciais para a economia global do que as da maioria dos territórios analisados, considera a organização não governamental.

Na elisão, Portugal "pontua como um paraíso fiscal"
Por outro lado, a Tax Justice critica o facto de Portugal não exigir às multinacionais que publiquem o planeamento fiscal, pedindo mais transparência. "Esta regulação podia limitar práticas de elisão fiscal de forma substancial", afirma Lucas Narotzky.

Além disso, a organização critica a insuficiência de medidas antielisão e que impeçam a transferência de lucros. Nesta categoria, "Portugal pontua como um paraíso fiscal", afirma o investigador. Isto porque, por exemplo, não estão previstos limites à dedução da percentagem dos juros com empréstimos por empresas dentro do mesmo grupo.

Portugal reforça combate à elisão

Portugal transpôs para a legislação portuguesa uma diretiva europeia que prevê um pacote de medidas para evitar a fuga aos impostos de multinacionais através de esquemas que diminuem os lucros obtidos em Portugal. O diploma contempla alterações ao nível da limitação da dedutibilidade de gastos de financiamento (ajustando a definição deste conceito) e da cláusula geral antiabuso, direcionando-a para os beneficiários efetivos do rendimento. O diploma contempla também medidas ao nível do regime de tributação à saída. Na mira destas medidas fiscais está a utilização, por parte de algumas empresas, das disparidades entre os sistemas fiscais dos diferentes países, que procuram "beneficiar de taxas de tributação reduzidas, de duplas deduções ou mesmo de ausência de uma tributação efetiva dos lucros que obtêm", lê-se no documento.



Pontos negativos

Eis algumas das características mais negativas da legislação fiscal portuguesa, segundo a Tax Justice.

Fundos de capital
de risco isentos
•"Os fundos de capital de risco estão completamente isentos de IRC. Os cidadãos portugueses deviam reconsiderar se o valor social destes negócios justificam este tratamento preferencial", defende Lucas Narotzky.

Limitação de dedução
de juros e dividendos
•Em 2018, Portugal não definia um limite ao juros com empréstimos intragrupo que podiam ser imputados e deduzidos nas subsidiárias europeias. Além disso, exclui de retenção na fonte o pagamento de dividendos para empresas residentes nos Estados-membros, critica a Tax Justice.

Decisões judiciais não são publicadas totalmente
• Embora os processos nos tribunais tributários sejam abertos ao público, os textos finais das decisões não são publicados online de forma consistente. "Traria um escrutínio mais forte pelos media", afirma Lucas Narotzky.

Regime de patentes
"prejudicial"
•"Portugal tem um regime de patentes prejudicial que estará em vigor até 2021", diz Lucas Nartozky. As regras para as empresas beneficiarem de uma isenção parcial mudaram em 2016, mas existe, até esse ano, um regime transitório mais favorável. Além disso, a Tax Justice diz que as mudanças não foram suficientes para prevenir a transferência de lucros.

Empresas e consultores não divulgam planos
•Outra crítica da Tax Justice é que embora as empresas e os consultores tenham de reportar o planeamento fiscal, esses planos não estão publicados.