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Credores cumprem ameaça e tomam concessão à Brisa
JORNAL DE NEGÓCIOS


Os fundos e bancos credores da Auto-Estradas Douro Litoral (AEDL) cumpriram a ameaça que fizeram em outubro à Brisa, caso não recuperassem parte da dívida de 1.010 milhões de euros.

Esta quinta-feira, "as participações sociais da concessionária AEDL foram transferidas para um conjunto de credores liderado pelos fundos de investimento" geridos ou assessorados pela Strategic Value Partners e Cross Ocean Adviser, avançou a concessionária numa declaração sobre a alteração da estrutura acionista na qual indica também os novos órgãos sociais. Além dos dois fundos, o grupo de credores inclui o Deutsche Bank e o JP Morgan.

Contactada pelo Negócios, a Brisa, que registou já imparidades no seu balanço de 300 milhões de euros para a Douro Litoral, disse apenas esta quinta-feira não ter "comentários a fazer neste momento". O grupo liderado por Vasco de Mello estará a preparar uma reação à tomada de controlo da AEDL, numa altura em que as partes tinham iniciado negociações. No entanto, ao Negócios, Manuel Martinez-Fidalgo, diretor da Houlihan Lokey, que representa o conjunto dos credores, salientou as "prolongadas negociações com pouco progresso".

Na nota enviada esta quinta-feira, é salientado que, "nos últimos cinco anos, a AEDL tem incumprido as suas obrigações de pagamento de reembolsos de capital, juros, custos e comissões dos seus contratos financeiros, devido a uma estrutura de custos elevados e níveis de tráfego que estão abaixo das expectativas originais". Até agora, aos credores só tinham chegado fundos para amortização de capital de cerca de 50 milhões de euros na Douro Litoral provenientes das compensações financeiras que o Estado foi condenado a pagar à concessionária.

Agora, a intenção dos credores – que nomearam já para presidente do conselho de administração da AEDL Andy Pearson, e José Custódio dos Santos para diretor-geral da concessão – é de imediato analisar os anteriores atos de gestão, e a partir daí avançar com uma restruturação, designadamente financeira, da concessionária.

Citado na nota enviada, o novo diretor-geral sublinha que começou "um novo período para a AEDL, com a nova estrutura acionista, que proporciona à concessão uma base financeira fortalecida que garantirá o seu futuro", acrescentando que "a principal prioridade da equipa de gestão será assegurar que a concessão forneça aos seus clientes os mais altos níveis de serviço e segurança". Apesar da alteração acionista, a Brisa poderá, se o quiser, continuar a assegurar a operação e manutenção desta concessão.

Sem necessidade de autorização

A tomada de controlo da AEDL pelo grupo de credores está prevista no contrato de concessão que, neste caso em concreto, não requer, segundo o seu entendimento, a necessidade de uma autorização formal do Estado, que é o concedente, ao contrário de outros contratos que preveem que, em caso de alteração na estrutura acionista, têm de ser dadas garantias técnicas e financeiras. Desta forma, consideram que o exercício do direito de "step in" [tomada de controlo] foi feito de acordo com o contrato, sendo que a concessionária se mantém a mesma, o que muda é a estrutura acionista. Nem o Ministério do Planeamento e das Infraestruturas nem o Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT), que é o representante do Estado neste contrato, fizeram esta quinta-feira qualquer comentário à decisão dos credores da AEDL.



PERGUNTAS A MANUEL MARTINEZ-FIDALGO
DIRETOR DA HOULIHAN LOKEY

"Direitos dos credores são respeitados"

Para o representante dos credores, a decisão tomada vem mostrar que em Portugal os seus direitos são respeitados.

Porque decidiram os credores assumir o controlo da concessão?
Depois de estar em incumprimento desde 2014 e de prolongadas negociações com pouco progresso, os credores optaram por exercer a opção de ‘step in’, que foi negociada e incluída no contrato para o cenário de a empresa falhar pagamentos.

O que muda?
É apenas uma mudança de propriedade o que, na perspetiva dos utilizadores, não tem impacto algum. A transferência de propriedade de empresas ou ativos dos proprietários para credores quando a empresa ou o ativo não pode pagar as dívidas e o proprietário não fornece apoio financeiro adicional é a norma em todo o mundo, também em Portugal. Além disso, ‘o step in’ é um mecanismo padrão de proteção ao credor em qualquer acordo de infraestrutura. O ataque a esse recurso coloca em risco a disponibilidade de capital para projetos futuros.

O que vai resultar daqui?
Isto é importante para Portugal, uma vez que vai demonstrar aos mercados de capitais internacionais que Portugal fornece uma sólida estrutura de investimento onde todos os direitos dos credores (incluindo os dos investidores estrangeiros) são respeitados.