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Costa segura leis laborais
Expresso


O primeiro-ministro impôs uma linha vermelha às mexidas no Código de Trabalho que não irão além de retoques no atual regime do banco de horas e do trabalho noturno, assim como no combate ao trabalho precário. António Costa tenta, assim, com o empenhado apoio do Presidente da República, travar o crescendo reivindicativo dos parceiros de esquerda que querem mudar, no Parlamento, o que tem sido travado na concertação social. O PCP quer o assunto resolvido até ao verão. Caso contrário, as contradições com o PS podem tornar-se “insanáveis”.

Esta pressão não deverá, porém, ter os efeitos desejados por comunistas e bloquistas. Porque “sem prejuízo de algum pormenor para que se possa progredir noutras áreas”, aquilo que os socialistas farão até 2019 “é executar o que está no programa de Governo”. “Que é basicamente o fim do banco de horas individual e a penalização das empresas que recorram a contratos a prazo e trabalho precário. Esse é o nosso caderno de encargos”, sintetizou ao Expresso o líder parlamentar do PS, Carlos César, pouco antes de o partido chumbar, ao lado do PSD e do CDS, as propostas de PCP, BE e PAN para repor os pagamentos por horas extraordinárias.

César não fecha completamente a porta a potenciais entendimentos adicionais, mas deixa claro o contexto em que tal pode ocorrer. “Observando-se ao nível da concertação social um consenso mais aproximado, não vejo razão para que não se avance num ou noutro aspeto em que o Governo concorde”, admite, reconhecendo ser pouco expectável que esses consensos ocorram. “Há duas tensões em matéria de legislação laboral, as patronais e as sindicais, que são inversas e proativas. O que tentamos dizer a ambas as partes é que as alterações devem ser simples e não devem afetar equilíbrios constituídos”, diz, assumindo que as questões laborais serão, até 2019, “uma das áreas de gestão mais complexas para os partidos que apoiam o Governo”.

Marcelo agradece

A determinação de António Costa em manter o essencial das leis laborais é partilhada pelo Presidente da República, que deixou claro junto do primeiro-ministro não concordar com mexidas que pusessem em causa os tais equilíbrios adquiridos. Marcelo Rebelo de Sousa tem sido um canal privilegiado com os parceiros sociais e uma espécie de porta-voz das preocupações das confederações patronais junto da ‘geringonça’.

No decreto de promulgação do último Orçamento de Estado, Marcelo deixou avisos que colam bem com as preocupações dos empresários e um deles prende-se precisamente com a necessidade que o Presidente defende de estabilidade na legislação laboral. Esta semana, o PR voltou a fazer uma ronda pelos parceiros e na segunda semana do mês volta a receber os partidos. Ciente de que a segunda metade da legislatura vai dar mais trabalho, Marcelo não prescinde de ter um papel ativo na tentativa de evitar fraturas dentro da maioria de esquerda. Fraturas que já espreitam.

PCP: agora ou nunca

A esquerda parlamentar sabe que a “janela de oportunidade” que existe é de alguns meses. “Até ao verão, antes das férias e do debate do próximo OE, estas matérias têm de ser esclarecidas”, diz fonte da bancada do PCP. O aumento do valor do trabalho suplementar e das indemnizações por despedimento são pontos de honra para os comunistas, que alegam tratar-se apenas de “reposição de direitos perdidos na altura da troika”. E se não constam da posição conjunta nem do programa do Governo, isso não impede o PCP de considerar que estão “dentro do espírito” do entendimento político. E tendo sido aprovada no OE deste ano a reposição do valor do trabalho suplementar para a Função Pública, o alargamento para o privado é considerado “lógico e justo”.

Mas é na contratação coletiva que os comunistas — e a CGTP — concentram atenções. A central sindical apresentou no Parlamento uma petição com mais de 76 mil assinaturas, que é de apreciação obrigatória. Aproveitando a embalagem, o PCP avança com uma proposta de alteração legislativa sobre a questão que é uma linha vermelha de demarcação com o PS. Jerónimo de Sousa deixou, esta semana, em entrevista ao “Público”, um aviso: “A questão dos direitos dos trabalhadores sempre foi uma zona de fronteira entre a esquerda e a direita” e “quem se declarar de esquerda tem de ter essa responsabilidade de beneficiar a parte mais débil”.

A estratégia do PCP passa por concentrar no Parlamento a iniciativa legislativa, evitando uma passagem pela concertação social onde as alterações ao código de trabalho encontram a maior resistência por parte dos patrões, mas não só. A UGT, que tem na concertação o seu principal palco, acusou o toque, e esta semana, Carlos Silva foi de uma violência inaudita nos ataques à CGTP. Nas jornadas parlamentares do CDS, disse que havia “agitadores profissionais” a toldar as negociações na Autoeuropa, numa indireta ao braço de ferro que a Intersindical mantém na fábrica do grupo Volkswagen. A luta em Palmela é, para os comunistas, a prova de que a legislação do trabalho tem de ser revertida. Se a norma da caducidade dos contratos coletivos já tivesse sido expurgada, a margem negocial com a administração era maior, assim como a pressão para fechar um novo acordo. De outra forma, os sindicatos estão ‘condenados’ a cumprir a lei geral que reduz drasticamente o valor do trabalho em fins de semana em relação ao que era, até agora, prática corrente na empresa.

NEGOCIAÇÃO

Deputada do PS desalinhada

Vanda Guimarães, deputada do PS e vice-presidente da comissão parlamentar de trabalho, defende que a Assembleia da República deve viabilizar o aumento do valor das horas extraordinárias e das indemnizações por despedimento. As matérias não constam do programa do Governo, nem a bancada socialista mostra, até agora, qualquer intenção de alinhar com PCP e BE na promoção destas alterações legislativas. “Trata-se da reposição de direitos perdidos no tempo da troika”, afirmou ao Expresso, alegando ainda que as alterações “repõem o que foi previsto no código de trabalho de 2009, redigido por um Governo socialista e pelo então (e atual) ministro Vieira da Silva”. É uma voz desalinhada dentro da bancada socialista e que, na reunião desta semana do grupo parlamentar, assumiu isso mesmo. “Não tenho duas caras: estive nas negociações do acordo de Concertação Social de 2012 e sei como estas medidas foram tomadas para evitar males maiores”, recorda Vanda Guimarães. Fundadora da UGT, histórica sindicalista, é agora a mais velha deputada do Parlamento e protagonizou, recentemente, uma negociação inédita: em sede de comissão parlamentar conseguiu juntar PCP, Bloco e PS na concertação de uma alteração ao código de trabalho para permitir o direito de oposição dos trabalhadores nos processos de transmissão de estabelecimento. Uma união de esquerdas que não será replicada nos tempos mais próximos. “Não vejo o PS muito de acordo com a minha opinião”, conclui Vanda Guimarães. R.P.L.