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António Saraiva: A reversão das leis laborais, "para nós, é uma linha vermelha"
Jornal de Negócios


António Saraiva, presidente da CIP, faz questão de dizer que não acompanha a reivindicação do PCP para que o salário mínimo suba já em Janeiro para os 600 euros. Admite que os 580 euros que estão sobre a mesa da próxima reunião de concertação social até poderão ser aceites, mas com contrapartidas. Já eventuais reversões na legislação laboral rejeita-as liminarmente, traçando aqui uma "linha vermelha".

O salário mínimo vai voltar à concertação social. Há disponibilidade da vossa parte para aceitar a proposta do PCP de aumento dos 600 euros já no próximo ano?

Não, não há. E não é porque o salário mínimo não devesse ser, assim o país tivesse condições e as empresas para o suportarem, dessa dimensão. Recordo que o salário mínimo aumentou nestes dois últimos anos 17,3%. O PCP e CGTP, vamos reconhecer-lhes a coerência, sempre têm dito que o salário mínimo deve ser 600 euros. Mas vejo nessa argumentação do PCP uma luta partidária com o Bloco de Esquerda.

Trata-se de uma luta partidária entre Bloco e PCP?

O Bloco capitalizou a seu favor a questão das pensões, batalha que o PCP perdeu. Por isso, quer condicionar o Bloco dizendo que, por eles (PCP), o salário mínimo já seria de 600 euros em 2018 e só não é porque o Bloco aceitou com o PS que fosse 580. Vamos entrar na discussão de um novo acordo de concertação, onde o salário mínimo será uma das variáveis, mas não posso deixar de dizer que vamos entrar menos receptivos .

Porque é que vão entrar menos receptivos?

Não porque não estejamos disponíveis a aceitar que o salário mínimo venha a ser de 580 euros, mas dependendo das contrapartidas que têm que se encontrar para as empresas. Não para as empresas em geral, mas discriminando positivamente as que possam estarem mais frágeis, mais expostas [à concorrência com empresas de outros países europeus]. Porquê menos receptivos? Porque em 2016 a expectativa que colocámos no acordo não foi cumprida nalgumas das metas. Estamos em Novembro de 2017, quase a esgotar o ano, e uma das nossas propostas no âmbito do último acordo está por concretizar.

Que proposta?

O Fundo de Compensação do Trabalho, o famoso FCT, está capitalizado em cerca de 150 milhões de euros. Historicamente foram utilizados cerca de 40 milhões. Passamos por uma fase em que, felizmente, estamos a empregar e não a desempregar, o fundo para aquilo que se destinava não precisa de estar tão fortemente capitalizado e é preciso encontrar uma forma de aliviar as empresas que estão carrear mensalmente para esse fundo sete milhões de euros e sem qualquer objectividade.

A matéria da legislação laboral pode também ser aqui envolvida com contrapartida?

O quadro legal que temos hoje em termos de legislação laboral não é impeditivo ao normal funcionamento das actividades económicas. A legislação laboral deve manter-se como está, "tout court". Não podemos é permitir reversões, como algumas forças políticas e sindicais pretendem. Não se mexa na legislação laboral, porque ela está bem, e tem sempre margem de progressão em sede de concertação colectiva. Não permitiremos qualquer reversão daquilo que hoje existe, e isso para nós é uma linha vermelha.

A diferenciação contributiva ao nível da TSU para as empresas que contratem sem termo poderá chegar à a mesa da concertação social. Deve ou não avançar?

Se compararmos o segundo trimestre de 2016 com o segundo trimestre de 2017, a população empregada por contrato, 90% é sem termo. Com termo 10%. Acho que isto diz tudo. Mas se quisermos uma série mais longa, se compararmos o quarto trimestre de 2013, final de 2013, com o segundo trimestre de 2017 contratos sem termo 68,8%, com termo, a prazo, 28,7%. Se esta é a realidade agora, por que razão se quer penalizar as empresas discriminando em sede de TSU aqueles que estão já hoje a contratar sem termo. O que nós temos é que premiar aqueles que estão a contratar com estas características.

Premiar de que forma?

Premiar é não mexer. Temos de combater a precariedade? Temos. Temos de combater as desigualdades sociais? Temos. Temos de melhorar o salário mínimo? Temos. Mas temos de o fazer numa perspectiva racional, com sustentabilidade e com discussões intelectualmente honestas.